sexta-feira, 7 de junho de 2013

Meritocracia

- Meritocracia – explicava o economista ao biólogo – é a avaliação e posicionamento do indivíduo segundo seu mérito. Ao se utilizar esse critério permite-se que os mais eficientes, ou seja, os que possuem melhor desempenho e apresentam melhores resultados, conquistem posições de destaque dentro da cadeia produtiva. Maravilhoso, né? Não é por acaso que ela é a principal forma de avaliação atualmente. - Algo nesse critério me soou estranho – disse o biólogo - um pouco injusto... - Injusto, como assim? A pessoa é recompensada justamente conforme o seu merecimento. É a forma de compensação mais justa que existe. - Vejo de forma um pouco diferente. Não entendo de administração e portanto não saberia apresentar uma forma de avaliação melhor, mas o fato é que esse critério me soa primitivo e conformista... - Primitivo? Conformista? A meritocracia vai diretamente contra o conformismo, pois se o indivíduo quer crescer ele precisa sair da zona de conforto e se movimentar. - Sim, entendi isso. Mas o conformismo a que eu me refiro não é o do indivíduo, e sim o da sociedade. Parece que ao atribuir a posição social do indivíduo ao seu próprio mérito, implicitamente justifica-se a desigualdade, a miséria, etc. como responsabilidade do próprio indivíduo, ignorando fatores externos e eximindo o Estado de qualquer culpa. - Existem os fatores externos sim, mas o ponto é como o indivíduo interage com esses fatores para mudar a situação. Existem vários exemplos de pessoas que no passado viveram intensas condições de adversidade e mesmo assim deram a volta por cima e se tornaram cases de sucesso! - Sim, existem. O que me parece injusto é utilizar esses raros casos de sucesso como parâmetro, e taxar a maioria quase absoluta com o implícito título de fracassado, ou looser como dizem os norte americanos. Como se o que separasse o camelô do empresário de sucesso fosse simplesmente o mérito do próprio camelô. Mas o fato é que é para que haja empresários é necessário que haja os camelôs, pois nem o meio ambiente e nem mesmo a economia (ciência da escassez, correto?) suportaria a carga de uma humanidade composta somente por empresários bem sucedidos. - A sua área fornece um excelente exemplo sobre isso: a teoria da evolução! O melhor adaptado ao meio sobrevive. É isso o que acontece na nossa sociedade! Afinal, somos animais, correto? - Já que estamos usando exemplos da minha área, eu diria que o que acontece é mais parecido com a cadeia alimentar mesmo, pura e simples. O mais forte devora o mais fraco e ponto final. Por isso eu falei que a meritocracia me soava um tanto primitiva e conformista. Somos racionais, com poder de modificar o meio, de evoluir. Acredito que a zona de conforto da qual temos de sair é esse estado primitivo onde nos parece natural que uns tenham que morrer para que outros possam comer, que tantos tenham de sofrer para que outros possam gozar. Eu discordo quando você diz que a meritocracia funciona como a teoria da evolução. Na verdade ela me parece muito mais lamarquista, pois o desenvolvimento deriva do estímulo do indivíduo. Quando mais e melhor estimulado, mais desenvolvido. E a questão da descendência também escorre do Lamarck para a meritocracia, pois a posição social do pai seguramente influenciará na posição social do filho, mesmo que indiretamente. Pois quanto mais alta a posição, mais alto é o perfil socioeconômico, e obviamente maior o acesso à saúde, educação, informação etc. É possível admitir que tanto o filho do camelô quanto o filho do empresário de sucesso possui a mesma base para o desenvolvimento pessoal e que portanto o sucesso ou fracasso de cada um depende exclusivamente do seu próprio mérito? A transmissão de características adquiridas aos descendentes, pregada pelo Lamarck, poderia ser transportada para a ideologia da meritocracia como a renda que o filho dispõe para sua formação e que foi adquirida pelo pai ao longo de sua vida. E ao falar em renda nós voltamos para a sua área...

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