segunda-feira, 31 de agosto de 2009

O Homem Sem Rosto

Essa poesia segue um linha diferente das outras poesias dessa fase. Ao invés de canção, é uma história...

Havia um homem,
Que não tinha nome
Nem tinha rosto.
Não tinha família,
Tampouco amigos.
Não tinha vícios.
Não sabia o que era o medo,
Desconhecia o ódio,
Nunca havia sentido amor.
E caminhava.
Sem nunca chegar,
Ele não tinha um lar.
Procurava algo,
Algo que lhe desse um rosto.
Até aquele momento
Não sabia se era feliz,
Pois embora nunca houvesse chorado,
Também não se lembrava
De algum dia haver sorrido.

Nem sede, nem fome,
Sem cansaço ou dor.
O vazio era sua rotina.
Nenhum tipo de trabalho,
Nenhum tipo de hobby.
Ele não tinha fé.
Nem ideologia,
Nem filosofia.
E não tinha paz.
Andara o mundo
Mas não tinha pátria.
O que fazia era procurar.
Ele tinha pressa.

Ou ansiedade...?

Seria isso?
Sua única sensação
E não a conseguia definir!
Na verdade
Era apenas um mal estar,
Como se no meio do vazio,
Algo incomodasse.
Ficasse a formigar,
A borbulhar,
A se torcer.
De lá ele tirava forças
Para continuar a busca.
De lá...
E também de algo parecido
com um sonho, ou uma visão:

Encontrava uma criatura
Vazia como ele.
Ele ia a ela.
Ela ia a ele.
Ambos se atraíam,
Contemplavam-se,
Preenchiam-se.
Os dois sozinhos,
Os dois sem rostos.

Muitas vezes se perguntara
Se aquela criatura era Deus,
Ou se era o amor,
Ou se Deus era o amor;
Sem nunca, entretanto,
Chegar a uma conclusão.

Buscava sempre.
Às vezes em carreira,
Às vezes parado.
Variava conforme
A intensidade da sensação.
Sem seguir um método,
Sem nenhum critério.
A única regra
Era o tempo.
Ele teria fim.
E num momento de angústia
(Seria angústia, ou apenas a ansiedade extremada?)
Resolveu antecipa-lo.
Caminhou até um rio.
E pulou.
Ele não sabia nadar.

No instante do pulo, entretanto,
Teve uma surpresa:
Viu seu reflexo na água.
Uma criatura vazia,
Sem rosto.
Ele ia a ela.
Ela ia a ele.
Ambos se atraíam.
E quando se tocaram
E a água o envolveu
Imaginou por um momento
Ter alcançado seu objetivo
Ter cumprido sua sina:
Buscar, desde o princípio, o fim.

Mas enquanto rodopiava
Naquele meio turvo
Percebeu que era engano.
Que aquela visão, na verdade,
Mostrava que sua busca
Era por si mesmo.
Apenas se encontrando
Ele se preencheria.
E então quis viver.
Seria muito triste morrer
Sem saber o que era amar,
O que era sorrir,
O que era ter paz.

Mas ele não sabia nadar.
E então sofreu.
Teve ódio de si mesmo
Por não ter compreendido,
Por ter sido fraco.
Em vão se debatia
contra a força daquela massa
Que indiferente o levava.
E teve primeiro medo,
Depois desespero,
E, por fim, deixou de ter...

...E teve susto!
Estava na margem de um remanso.
Sentia dor.
Percebeu então que estava vivo
E percebeu quantas sensações sentira e sentia
E sorriu.
Havia conseguido,
Estava em paz.
Olhou ao redor.
Viu as mesmas coisas que sempre vira
Mas de modo diferente.
Não sabia em que diferiam,
Mas sabia que as amava.
Porque amava a vida
A compaixão do tempo
Amava-se.

Permaneceu em silêncio.
Pois agora tinha tudo
Mas não tinha palavras.
Ergueu-se e procurou Deus.
Mas sabia que não o veria,
E sabia o porquê.

Então começou a caminhar.
Estava feliz.
Até pensou em se mirar no espelho das águas,
Mas mudou de idéia.
Não era preciso,
Pois sabia que agora
Ele tinha um rosto.

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